Tony Loureiro

QUAL É A TUA OBRA?

QUAL É A TUA OBRA?

O grande incremento na expectativa de vida das pessoas, ocorrido durante o século XX, pode ser considerado como uma das maiores conquistas de nossa sociedade. Enquanto boa parte dos bebês nascidos em 1900 não viviam mais que cinquenta anos, a expectativa de vida do Japão, hoje, supera os 83 anos, o que coloca o país como líder atual. Vários outros países já atingiram a marca dos 81 anos. A mudança mais dramática ocorreu no leste asiático, onde a expectativa de vida aumentou de menos de 45 anos, em 1950, para mais de 74 anos na atualidade.

Uma maior expectativa de vida faz com que muitos de nós, principalmente na segunda metade de nossa existência, comecemos a questionar o seu sentido. Recentemente, ouvi de um executivo a seguinte reflexão: “Será que tudo se resume a nascer, crescer, estudar, trabalhar, casar, ter filhos, adquirir alguns bens e morrer?”

Ele me relatou que, quando jovem, havia sido aprovado em uma das melhores universidades norte-americanas. Recordava das aulas em período integral e das noites passadas, em claro, estudando. O clima de competitividade entre os alunos era imenso, carregavam, sob suas costas, o peso da expectativa de seus pais, familiares e professores. Recordava que, após a universidade, desejava encontrar um emprego que lhe permitisse ter satisfação e um senso de contribuição.

O que lhe dava alento e lhe fazia suportar toda a pressão dos estudos naquela universidade erasaber que, após seu término, poderia iniciar sua carreira e buscar um trabalho condizente com suas aspirações. Foi então que, no último ano na escola, ouviu de um professor que de nada serviria seus diplomas se não fossem aceitos como trainees em uma grande corporação, momento em que poderiam iniciar uma carreira de sucesso e realizações. Lembrava-se de ter ficado ansioso e, no dia seguinte, iniciou sua procura por uma vaga. Imaginava que, após ser aceito, sua carreira estaria encaminhada e então, finalmente, estaria realizado. Após ser aprovado em um dificílimo processo de seleção, descobriu que ter sido aceito como trainee foi somente o início e que agora precisava ser efetivado naquela grande empresa. Trabalhava de forma insana, pois sabia que, uma vez contratado, tudo iria mudar.

Foi contratado! Comprou seu primeiro carro e contraiu o financiamento para sua casa própria. Naquela mesma época, começou a perceber que seu trabalho não lhe oferecia nenhum senso de realização. Mas agora precisava ser gerente! A empresa lhe dava bônus por metas e resultados e incentivava longas horas de trabalho. Foi também nessa época que se casou com sua antiga namorada de escola, tendo resolvido alguns problemas de trabalho, por telefone, até mesmo em sua lua de mel.

Foi promovido a gerente no mesmo ano em que nasceu seu primeiro filho. Saía de casa quando seu menino ainda não tinha acordado e retornava quando já havia dormido. Seu alento é que fazia todo aquele sacrifício por sua família e que tudo mudaria quando se tornasse diretor. Seguia sua vida no automático, trabalho, casa e trabalho! Embora somente dissesse aos seus amigos íntimos, o status adquirido, os bônus anuais e a estabilidade no emprego tornaram-se grandes demais para que pensasse em fazer outra coisa.

Neste momento, caro(a) leitor(a), creio que posso interromper minha narrativa, pois já sabemos onde esta história terminará. Terminou quando esse amigo já estava com 68 anos, ocupando um dos cargos de vice-presidente da companhia e foi informado que era hora de planejar sua aposentadoria e sucessão.

Foi quando percebeu, já na idade madura, que sua vida fora o que chamo de “corrida de ratos”. Uma vida destituída de propósito, centrada em muito trabalho e pouco sentido. Uma vida em que os relacionamentos foram sacrificados e toda sua energia foi direcionada à próxima promoção e à aquisição de bens materiais.

Veja bem, tenho visto esse padrão com muita frequência entre clientes e pessoas próximas. A corrida de ratos representa um modelo em que as pessoas descuidam-se de seu presente e centram todas suas expectativas e esperanças em um futuro próximo ou remoto. Quando esse futuro chegar, aí, sim, serão felizes. O problema é que o “futuro” nunca chega, pois sempre haverá uma nova promoção ou uma casa maior a ser comprada.

Não advogo a ideia de que o trabalho não é importante, mas, sim, a de que precisamos repensar nossas vidas e trabalho à luz de nossos valores, princípios e propósitos, pois, respondendo à pergunta que me foi feita por meu amigo, acredito, sinceramente, que a vida é mais do que nascer, crescer, estudar, trabalhar, casar, ter filhos, adquirir alguns bens e morrer.

Como brinca Mario Sergio Cortella, ingerimos, ao longo de nossa vida, aproximadamente um quilo e meio de alimentos (sólidos e líquidos) por dia e produzimos mais ou menos a mesma cifra de dejetos, diariamente, por meio de nosso sistema digestivo. Ao longo de uma vida de 75 anos, consumiremos 42 toneladas de alimentos e produziremos a mesma quantidade de dejetos.Logo, ao partirmos, pelo menos nisso o planeta estará diferente em função de nossa passagem. Será que essa terá sido nossa obra?

Nos meus próximos artigos, vou falar sobre a dimensão espiritual do ser humano mas não necessiariamente em religião ou em práticas espirituais, embora, pessoalmente, seja um homem de fé. Não imagino minha vida sem a ideia e conexão com o Divino. Mas sei a imensa dificuldade que qualquer um enfrentará ao decidir falar sobre tais assuntos, devido às paixões que o tema desperta e as inimizades que provoca, no momento em que enveredar pelos assuntos relacionados à religião e espiritualidade. Não abordarei esse tema, primeiro, por falta de legitimidade para tal e também por não ser o objetivo desta obra.

No futuro enfoque, a dimensão espiritual do ser humano está ligada a ter uma vida profissional feliz e com sentido. Uma vida profissional imbuída de propósito. Entendo que, ainda que tenhamos um corpo e mente sãos e sejamos equilibrados emocionalmente, se não conseguimos dar um senso de propósito a nossa existência e trabalho, corremos o risco de levar uma vida superficial, egocêntrica e destituída de significado.

Por se tratar de artigos sobre liderança, meu objetivo é fazer uma análise sobre a relação existente entre o seu trabalho com a satisfação que sente em fazer o que faz, ou seja, com o grau de felicidade que temos ou não em nossas carreiras. O número de profissionais que se sentem infelizes em seus empregos é razão suficiente para me incentivar a fazê-lo.

Me acompanhe e venha comigo!

“Qual é a tua obra?” – Mário Sérgio Cortella

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